Tron: Ares (2025)
- Douglas Moutinho
- 20 de out.
- 3 min de leitura
Espetáculo Visual, Reflexão Superficial

Desde sua origem em 1982, Tron consolidou-se como uma franquia visionária ao antecipar questões da era digital. Em Tron: Ares, terceiro capítulo da série, o universo conceitual da saga é expandido com a introdução de uma nova entidade: Ares (vivido por Jared Leto), um programa de inteligência artificial capaz de atravessar a fronteira entre o mundo virtual e o real. Este novo protagonista não apenas amplia as possibilidades do enredo, como também encarna o ápice de um imaginário que há décadas especula sobre os riscos e encantos da simbiose homem-máquina.
A narrativa gira em torno da tentativa de Ares de permanecer no mundo físico, algo possível apenas por meio de um "código de permanência", atualmente nas mãos de Eve Kim (Greta Lee), CEO da poderosa ENCOM. Esse conflito técnico-ideológico insere-se organicamente no já estabelecido universo de Tron, onde a estética digital, os jogos de luz e o ritmo pulsante compõem uma atmosfera visualmente arrebatadora, típico da franquia.
No entanto, por trás das camadas de neon e sequências de ação coreografadas com competência, Tron: Ares sofre de uma fragilidade que o impede de atingir a potência que seu tema sugere. O filme é lançado num momento em que a inteligência artificial já não pertence mais à esfera da especulação futurista, mas à realidade cotidiana. Ela está em nossos algoritmos, decisões automatizadas e, paradoxalmente, nos próprios roteiros cinematográficos. Ao contrário de obras contemporâneas que mergulham criticamente nas implicações do uso descontrolado da IA como Missão Impossível: Acerto de Contas Parte 2, Tron: Ares opta por uma abordagem segura, quase conformista, tratando a IA como ferramenta de ação e não como agente de transformação (ou colapso) social.
A superficialidade do tratamento dado ao tema não é uma falha apenas de roteiro, mas um sintoma de um cinema de blockbuster ainda tímido diante de um debate que exige profundidade filosófica, política e ética. Tron: Ares sugere uma crise de identidade em seu protagonista artificial, mas jamais a explora com densidade suficiente para que o espectador sinta o peso desse conflito. Ares, enquanto figura, é fascinante, mas é reduzido a um arquétipo de herói digital funcional.
Em termos de continuidade narrativa, o filme adota a mesma estratégia de seu antecessor, Tron: O Legado: reconfigura o universo sem depender diretamente dos eventos anteriores. Isso torna Ares acessível ao grande público, embora sacrifique, nos minutos iniciais, a clareza conceitual algo que pode confundir espectadores não familiarizados com a mitologia da franquia. Felizmente, esse estranhamento inicial é diluído à medida que o filme avança e entrega o que se espera
Para os fãs mais antigos, há ainda o prazer das referências pontuais, algumas delas carregadas de nostalgia. O filme se vale desse vínculo afetivo com moderação e inteligência, sem se tornar refém dele, o que é louvável num tempo em que o fan service muitas vezes suprime a originalidade.
Em última instância, Tron: Ares é um espetáculo tecnicamente competente, que cumpre com dignidade seu papel de entretenimento. Porém, sua maior limitação está exatamente no espaço onde poderia ser mais ousado: a reflexão crítica. Ao abrir mão de explorar com vigor o que significa, de fato, a presença de inteligências artificiais no mundo real, o filme se contenta em repetir fórmulas já consolidadas. No fim, ele nos apresenta o futuro com as luzes certas, mas ainda com os dilemas do presente deixados na penumbra.
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