Presença (2024)
- Douglas Moutinho
- 5 de abr.
- 2 min de leitura
Atualizado: 12 de mai.
Entre o terror psicológico e o found footage
Um dos subgêneros cinematográficos mais proficuamente explorados na contemporaneidade é, sem dúvida, o denominado terror psicológico. Este segmento caracteriza-se por abordar o pavor de maneira mais intimista, introspectiva e comedida, despojando-se dos elementos visuais explícitos que comumente permeiam o gênero. O aclamado Alfred Hitchcock afirmou, com propriedade, que o verdadeiro medo reside, antes de mais nada, na iminência e na antecipação de uma ameaça, muito mais do que na própria materialização visual do horror. Tal reflexão parece ser o fio condutor de diversas produções do terror contemporâneo. Não é mera coincidência que muitos desses filmes se ocupem de temáticas relacionadas a entidades espirituais, rituais, demônios e distúrbios psicológicos — elementos, na sua grande maioria, invisíveis.

Dentro dessa tendência, insere-se Presença (2024), uma obra que se alinha a essas convenções, abordando a história de uma família que, ao se mudar para uma casa antes desprovida de qualquer manifestação sobrenatural, vê-se imersa em uma série de fenômenos inexplicáveis logo após sua chegada. Ao longo da narrativa, o espectador é conduzido a compartilhar da perspectiva da entidade que habita o local, observando os eventos de uma maneira subjetiva, enquanto os membros da família permanecem alheios à presença oculta. A utilização de planos subjetivos permeia toda a obra, aproximando-a de outro subgênero do terror amplamente explorado: o found footage, cujas características fundam-se na observação de acontecimentos por meio de gravações supostamente encontradas.
O grande mérito da direção e do roteiro de Presença reside justamente na subversão desse subgênero, entregando uma experiência sensorial pouco recorrente no universo cinematográfico. A direção de Steven Soderbergh — laureado com a Palma de Ouro em Cannes por Sexo, Mentiras e Videotape e vencedor do Oscar por Traffic — constrói a narrativa unicamente sob a ótica da entidade, utilizando longos planos sequência e uma lente teleobjetiva. Tal escolha técnica permite uma ampliação dos cômodos da casa, ao mesmo tempo em que proporciona um efeito de distorção nas laterais das imagens, caracterizando uma aparência de barril. Esse efeito confere um tom distorcido, como se as imagens vistas fossem de um plano diferente do plano de quem as vê.
O trabalho de Soderbergh se complementa de forma magistral com o roteiro de David Koepp (célebre por seu envolvimento em produções como Jurassic Park, Guerra dos Mundos, Missão Impossível, O Pagamento Final, Janela Secreta e Homem-Aranha) que mantém o mistério característico do terror psicológico, ao mesmo tempo em que semeia pistas sutis ao espectador, permitindo-lhe, progressivamente, decifrar os enigmas da trama.
Para os apreciadores do gênero, Presença configura-se como uma proposta interessante. Contudo, o filme peca ao não conseguir criar uma atmosfera suficientemente claustrofóbica e opressiva, o que, em certos momentos, faz com que os personagens pareçam desinteressados ou pouco afetados pela presença da entidade na casa. No entanto, essa característica apresenta uma dualidade: a proposta de soft horror pode ser vista como um atrativo para aqueles que não apreciam os métodos mais tradicionais e intensos do terror psicológico.
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