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O Quarto ao Lado (2024)

Atualizado: 21 de fev.

Filosofia e beleza na hora da morte

Crítica de O Quarto ao Lado (2024)

O que define um filme como bom ou ruim? Com certeza essa resposta demandaria uma longa tese e mesmo assim ela seria inconclusiva, sendo esse tema algo tão subjetivo. No entanto, há certo consenso entre a crítica e os historiadores do cinema no que concerne ao domínio e autoria de elementos estéticos ou narrativos das obras. Maestria em relação aos elementos fílmicos é indubitavelmente um fator contribuinte para a definição da qualidade do trabalho analisado. Dentro desse contexto, a dramaturgia emerge como um importante elemento narrativo para o filme.

A dramaturgia pode ser definida, no âmbito cinematográfico, como a técnica de representação temática através do roteiro. E uma boa dramaturgia pode ser considerada aquela onde o que é expresso não é exposto. Há o contraste do expor e do expressar e uma dramaturgia de qualidade expressa sem expor o seu tema. O tema fica nas entrelinhas, flutuando em torno de diálogos bem trabalhados que funcionam como máscaras para dramatizar o tema.

Crítica de O Quarto ao Lado (2024)

Nas mãos de um autor competente, uma dramaturgia bem desenvolvida se une a uma unidade estilística elaborada definida pelo diretor entregando uma obra memorável. E é exatamente isso que Pedro Almódovar nos entrega com a sua mais recente obra O Quarto ao Lado.

E qual é o tema do filme? Refletindo sobre isso, me deparo com entrelinhas tão complexas que tornam uma possível resposta pouco pertinente. É incrível como Almódovar consegue representar de forma tão assertiva tantos temas escondidos em diálogos sutis e profundos em apenas pouco mais de uma hora e meia de filme. Mas caso impere a necessidade por alguma nomenclaturização, poderia escolher em destacar vários temas: a dicotomia vida e morte; efemeridade; hedonismo; o limite da liberdade individual; aceitação; obrigação moral; amizade; a função da arte; influência da religião; a importância da política; a obrigação individual de se envolver com o coletivo. De qualquer forma, com tão rica dramaturgia, acredito que a obra flerte diferentemente com esses temas, a depender dos antecedentes do espectador.

Crítica de O Quarto ao Lado (2024)

Para um bom funcionamento de uma dramaturgia, ela depende não apenas do roteiro e da direção, mas também da atuação, pois o cinema é representação, e raramente há representação, nessa forma de arte, sem encenação. E no tocante a esse elemento, o filme novamente entrega um resultado acima da média, com atuações naturalistas por vezes sentimentais e por vezes contidas. Tilda Swinton entrega uma atuação magistral como Martha, uma mulher doente que está à beira da morte, que pede a uma amiga de longa data, Ingrid, interpretada também maravilhosamente por Julianne Moore, assistência para morrer em paz quando ela mesma decidir partir.

Quem acompanha a carreira de Almódovar reconhece quase que instantaneamente os seus filmes principalmente pela sua estética fortemente baseada no uso das cores. Embora em O Quarto ao Lado tal uso ainda seja inventivo, como quando Martha consegue ver beleza até mesmo no aquecimento global com os seus flocos de neve rosas, o filme não usa cores tão vibrantes características do diretor como as usadas em Volver, por exemplo. Essa escolha reflete a própria história do filme, assim como os seus questionamentos sutis e menos evidentes. Ao invés do uso mais expressivo da cor, Almódovar recorre ao uso luz como principal fio condutor visual da narrativa.

Crítica de O Quarto ao Lado (2024)

O Quarto ao Lado certamente figurará entre os melhores trabalhos do seu autor, sendo lembrado pela sua sutileza, complexidade dramatológica, encenação e mise-en-scène. Ele tem o potencial de estimular longas conversas após a sua sessão, tanto graças a sua profundidade temática como pela sua forma.


Crítica de O Quarto ao Lado (2024), de Pedro Almódovar

 
 

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