Jurassic Park: o Parque dos Dinossauros (1993)
- Douglas Moutinho
- 15 de set. de 2022
- 4 min de leitura
Atualizado: 10 de set. de 2024
Do vislumbre ao terror
O que pode ser chamado de prelúdio do filme funciona como o estabelecimento do status quo de toda a cosmologia do filme.
Jurassic Park: o parque dos dinossauros é um filme de ficção científica e aventura estadunidense de 1993, baseado na obra homônima de Michael Crichton, dirigido por Steven Spielberg, com roteiro de David Koepp e produzido pela Amblin Entertainment e distribuído pela Universal Pictures. O filme conta, no elenco, com Sam Neill, Laura Dern, Jeff Goldblum e Richard Attenborough.

O filme leva o espectador até um novo parque temático com dinossauros desenvolvidos geneticamente através de DNA de mosquitos preservados em âmbar. Praticamente todo o enredo se desenrola nesse cenário desconhecido, algo próximo a uma ilha intocada pela ação humana no decorrer da história. Um cenário onde até as plantas são oriundas do período pré-histórico compõe o espaço necessário para uma trama baseada no suspense e na incerteza, elementos certamente explorados por Steven Spielberg durante o longa.
Embora o filme seja uma obra de ficção científica, Spielberg adiciona muitos elementos do terror e do suspense em sua obra, o que pode ser evidenciado já no primeiro momento. Logo na primeira cena do filme, algo é transportado com grande cautela. Toda uma equipe, aparentemente preparada, se mobiliza para essa ação. Um container com algumas frestas logo surge em tela. A noite, o movimento das árvores balançando com o vento, silêncio em relação a uma trilha musical. Todo um cenário de suspense em torno do ato. Algo ocorre e é revelado que o que está sendo transportado é um dos dinossauros, um velociraptor, à saber. Apenas se vê seus olhos iluminados com fracos flashes de luz, sustentando o mistério sobre a criatura ao mesmo tempo que a revela aos poucos, enquanto gritos e cortes rápidos indiciam que a cena terminará em desfecho trágico.

O que pode ser chamado de prelúdio do filme funciona como o estabelecimento do status quo de toda a cosmologia do filme. O clima de mistério, noturno, úmido, refletirá toda a narrativa do filme.
Somos então apresentados aos personagens Dr. Grant e Dra. Sattler, que se encontram no seu lugar conhecido, em um sítio paleontológico, trabalhando. Eles recebem o convite de Hammond para avaliar o novo parque temático, juntamente com outro cientista, Malcolm. Somos então apresentados à premissa do filme: a aprovação ou não desse parque pelos três cientistas.
Acompanhamos a chegada ao parque, e a partir de então, passamos a descobrir o lugar através dos olhos desses personagens, nos maravilhando, nos chocando e refletindo de acordo com seus pensamentos. O primeiro dinossauro, com o qual a equipe de cientistas de depara, é o braquiossauro, nos maravilhando junto a eles graças a seu tamanho e imponência, em uma das cenas mais belas do filme cinema. A belíssima trilha musical de John Williams sonoriza esse primeiro momento de vislumbre.

Após essa cena marcante de vislumbre inicial, somos introduzidos a uma inércia uma expectativa crescente, e decepções sequenciais. Nada mais novo é visto, a não ser por indícios: raptores são alimentados e não podem ser vistos; filhotes nascem perante os olhos de todos, fazendo com que o clima de ansiedade cresça, despertando no espectador ainda mais a vontade de ver as versões adultas; há o encontro com um triceratops que se encontrava doente; e quando os protagonistas passam pela cerca do tiranossauro, nada encontram.
Em meio a tantas “decepções”, o clima gradativamente se torna mais obscuro, se assemelhando ao clima da cena inicial (o do ataque do velociraptor à equipe de transporte). O céu azul do início, de quando os três cientistas chegam ao parque, vai dando lugar a um clima escuro, enevoado, com nuvens carregadas se formando. Spielberg articula todos os elementos do filme para a cena seguinte. A iluminação se torna mais focada (à noite, o que gera a iluminação maior é a lanterna, o farol do carro e os raios da tempestade), enquanto o cenário é enquadrado de forma mais distante, esperando um evento de maior escala. O clima de expectativa culmina então na clássica cena da falha de energia, com os carros parados e o tiranossauro saindo de seu recinto. Nada de música e nada de ação, contemplamos o clássico silêncio do suspense para a entrada da maior ameaça do filme.
O tiranossauro surge finalmente fazendo com que a expectativa acabe. A ação do filme enfim é iniciada. O clima de suspense dá lugar ao de terror. Todas as cenas anteriores prepararam o espectador para esse ponto específico. Talvez por isso David Koepp tenha removido certos momentos de ação em seu roteiro adaptado. O vislumbre inicial pelo desconhecido e atrativo lugar primitivo dá lugar ao medo que se estabelece até o fim do longa, onde a exuberância do lugar mostrado em enquadramentos bastante amplos dá lugar a sensação de ansiedade através de enquadramentos mais aproximados em ambientes mais apertados e fechados, até claustrofóbico em determinados momentos, como na cena em que a Dra. Sattler tenta ligar novamente a energia.

É interessante notar que certas questões levantadas na primeira parte do filme apenas são respondidas na segunda parte, posterior ao ponto de virada. O que é a teoria do caos? Seria correto a utilização da ciência para modificar o que é biologicamente estabelecido? O objetivo mais forte da natureza é a procriação (ou sobrevivência)? A ciência brinca de Deus? Todas essas questões não necessitaram de uma resposta enquanto o vislumbre estava estabelecido. Todavia, na segunda parte do filme, todas essas perguntas são respondidas de forma cautelosa. Basicamente, vemos que a ciência é conservadora, enquanto o avanço científico descontrolado é um perigo. Steven Spielberg, Michael Crichton e David Koepp nos entregaram uma narrativa sobre dinossauros que podemos perfeitamente adaptar para os dias de hoje em seus debates sobre política, gênero, religião e outros.
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